UM POUCO DE TUDO II

Em outras ocasiões, Jorge Pires trocava as piadas por receitas.

Transcreverei duas delas, mas, esclareço, não me responsabilizo pelas suas qualidades.

Afinal, são receitas que já completaram cem anos de existência.

Receita 1
“TORTA DE LEITE”

460 gramas de assucar, 110 de amêndoas torradas e moídas, 3 calices de leite e 15 gramas de ovo.

Leva-se o leite ao fogo até levantar a fervura. Batem-se as gemas; junta-se tudo e leva-se ao formo numa torteira forrada com massa folhada

Receita 2
“CURURU À BAIANA”

Toma-se uma grande porção cururu miúdo, catem-se os talos grossos e ponham as folhas e grelos em panela com água e sal, azeite doce, alho picado, pimenta do reino e comary, cebolas e manteiga de dendê.

À parte cozinhem-se pedaços de carne de porco e de vacca e lancem-se da dita panella..

Sirva-se depois com angu de farinha de mandioca ou de fubá ou massa de batatas inglezas “

CLUBE DOS BOHEMIOS
Um dos clubes, do final do Século XIX, criado para as comemorações do Carnaval foi o acima citado. Transcrevo duas publicações, dessa alegre sociedade:

“SECÇÃO LIVRE”
CLUB DOS BOHEMIOS
A commissão do Club dos Bohemios, convida as pessoas que assignaram na lista para a fundação do mesmo a compareceram no dia 06 do corrente às 5 horas da tarde no prédio da rua 13 de Maio, na antiga sede da sociedade 3 de Maio.

“A COMISSÃO”
Na mesma coluna da edição seguinte:

CARNAVAL
Sabemos que um grupo de distinctos rapazes filiados ao Club dos Bohemios, ultimamente fundado nesta cidade, projectam fazer este anno um pomposo carnaval. Para conseguirem o seu desideratum sabemos terem contractado com o Sr. Roque de Castilho a confecção de deslumbrantes carros de críticas, alegorias, etc.

AVANTE BOHEMIOS!”

CLUBE DOS SATYROS
O Clube dos Satyros tinha uma proposta diferente, repleta de um humor ingênuo. Com o dinamismo da vida atual, acredito não haver mais oportunidades como essas. Para participar do Clube o associado tinha que tornar-se um deus grego, romano ou de outra origem. Assim sendo tínhamos os deuses Júpiter, Urano, Saturno, Netuno entre outros. Entre as mulheres tínhamos Vênus, Palas, Juno, etc. O interessante é que os membros do Clube tinham que guardar segredo dos acontecimentos de suas reuniões. O povo tomava conhecimento da sua existência através de publicações feitas nos jornais. Marte e Saturno aproveitavam-se da coluna chamada “Secção Livre” para essas divulgações. Por sinal, Marte e Saturno eram excelentes redatores. Júpiter era admirado por todos . Provavelmente exercia uma liderança que cativava todos os demais.

Seguem, algumas transcrições referentes ao Clube:



“SECÇÃO LIVRE”
CLUBE DOS SATYROS
Com toda a solemnidade, fundou-se domingo, nesta cidade o supra mencionado, para recreio dos deuses e nymphas deste pequeno Olympo.

Era de se notar o explendor, a pompa com que os nossos valentes Júpiter, Marte e Saturno adornaram a Encantadora Caverna dos Sonhos, tão cheia de poéticos attrativos.

Notava-se ali grande profusão de flores odoríferas, todos os perfumes do Oriente e os finos e esquisitos vinhos da Arábia.

Cada lábio de nympha era tão doce como o mel do Hymeto, ou como um favo de Jandahyra, na inspirada phrase do saudoso e pranteado Costa Pereira.

Júpiter tonante com sua fronte alva e magestosa derramava por todo o âmbito da Caverna Encantada lucilações de ardente amor e profunda symphatia. Procedendo-se à meia noite, do certamem plástico-esthetico annunciado, coube à formosa Vênus o pomo de ouro.

Esta deusa trajava alvíssima chlamide, tecida de nítida escama e pérolas preciosas, deixando perceber-se atravez da gaze finíssima que velava as suas formas celestes e esculpturaes, as fragrantes magnólias de seu collo, as suaves e perfumadas rosas de suas faces, e a narcótica papoula de sua bocca, cujo hálito embalsamava a “Caverna Encantada”.

Não menos solemne e magestosa foi seguramente o certame entre Juno e Pallas, cujas peregrinas bellesas, sem poderem ser equiparadas à da formosa Vênus eram, todavia, de fazer com que os deuses se aturdissem, para despertar depois do meio de uma conjuncção de auroras deslumbrantes.!!!

Longa seria a descripção minuciosa d’aquelle festim celeste; e si por ventura, a penetrante avidez de algum profano curioso quizer percrutar os mystérios, e insondáveis recessos daquelles sonhos encantados, devem proceder como aquelles que, procurando o deus Marte, e sob promessa de inviolável segredo resolverem se submetter a tão doce e ineffável captiveiro.

Grande já é o número de deuses; mesmo assim, Júpiter, que é bom e liberal e Republicano Glycerista, está disposto sempre a receber, sob as suas azas protectoras os cândidos e magnânimos corações, que se devotam e sacrificam-se a tão sublime ministério!!!

SATURNO
“CAVERNA ENCANTADA”
Em nova data, o Jornal “Correio do Amparo”, edição do dia 31 de outubro de 1897, na mesma coluna Secção Livre publicou nova manifestação do Clube dos Satyros. Vejamos:

SECÇÃO LIVRE
CLUBE DOS SATYROS
De ordem de Júpiter tonante, nosso poderoso e amado chefe, convida-se a todos os deuses do Olympo, inclusive todos os dryades, nayades e nereydes, para virem assistir amanhã, pela calada da noite, e subripticiamente, na “Caverna dos Sonhos”, que fica próximo ao rio Lethes, as bodas de Pelêo, às festas dos Silenos e ao certamen plástico-esthético, em que disputarão o pomo de ouro as famosas nymphas Juno, Pallas e Vênus.

Eu, Marte, e o meu companheiro e patrício Saturno, que é o Adonis das deusas, já preparamos a Caverna Encantada: há profusão de flores odoríferas, abundância de phaternos que produz sonhos mysteriosos!

Júpiter, já tomou as azas pendas da célere e altiva águia real, desatou um vôo precipite, e foi ter com o Amor para dizer-lhe que aguçasse bastante as suas setas ardentes.

MARTE

SEÇÃO LIVRE
As seções livres dos jornais serviam para divulgações variadas, despedidas, agradecimentos, posições políticas, críticas às autoridades, desabafos, discussões polêmicas, etc...

O interessante era que as pessoas em muitos casos não se identificavam, usavam pseudônimos. Muito comum era uma pessoa atacar, desmoralizar outra, no anonimato. Isto, nos dias atuais, é crime. A Constituição não admite o anonimato e a Imprensa não aceita publicações de quem não se identifica. Seguem transcrições de algumas seções livres interessantes:

SECÇÃO LIVRE - 1 – 13/01/1891
PARASITISMO
A natureza quase que propositalmente, fez enumerar em suas produções vegetaes um herbáceo conhecido pelo nome de parasita.

Sem affirmar, quaes sejam as propriedades dessa herva, por serem já muito conhecidas, direi apenas que alguns homens, fascinados pelo poder que ella tem de chupar a seiva dos outros vegetaes terminam por imital-a completamente sugando por sua vez o sangue de seus semelhantes e vivendo assim como parasitas, à custa da humanidade.

Que importa, dizem, sorvemos o sangue do próximo, que importa roubarmos quando neste recto procedimento vivemos bem e caminhamos para o apogeu da riqueza?

Eis ahi como raciocinam taes desgraçados. Mas infelizes deixam-se levar por uma consciência de lama que os impede de fazerem distincção entre carácter, pudor e honestidade, de uma consciência incapaz de avisal-os de que não podem continuar em seu intento immoral, porque além da lei divina que os castiga existe a lei humana que os censura, os reprova e os condemna, repelindo-os como membros da communhão social.

Ahí está o que deviam ter em vista os parasitas. Agora uma observação si há no Amparo quem soffra dessa doença, que se esforce por se curar comendo o que é seu e deixando aos outros o que lhes pertence.

Mas outra; si não me deixarem o que é meu declaro que hei de falar a imprensa não para despender dinheiro com futilidades, mas sim para mostrar ao povo amparense o homem parasita, o que farei com documentos irrefutáveis.”

M. P.

SEÇÃO LIVRE – 2 – CORREIO AMPARENSE – 26/04/1891
MUITO A PROPÓSITO
Actualmente que os cabos das brigadas dos generaes tanto censuram o procedimento da parte criteriosa e sensata da população, que até então menteve-se em espectativa e não quis adherir ao movimento de 15 de novembro de 1889, vem muito a propósito a transcripção de uns pedacinhos de piro que sob a epígraphe – mentirosos – escreveu “José Maior” em o Diário de Notícias de 18 do corrente:

Ei-los

Esses defuntos pelos quaes o Correio está gastando cera, são os homens falsos de idéia, de convicção e de brio, amidos de todos os poderosos, bajuladores de todos os governos, contando que se lhes alimenta a ambição deshonesta e se lhes pague em favores o preço de uma dedicação repudiável.

São os adhesistas fáceis e basta.

Basta , porque um homem de patriotismo e dignidade não adhere a um systema de governo que lhe é adverso, desconhecido, não praticado, sem promeiro ver a superioridade de tal systema sobre o regimem que apóia.

Quando muito, uma pessoa senhora de mérito próprio e honestidade precisa, diante de um facto como o de 15 de novembro de 89, conformar-se entra para a espectativa, espera o melhor caminho que o futuro apontar. Mas os alliados do Correio não fizeram assim.

Prometteram-lhe um emprego vitalício, um hectare de terra, um logar de intendente e ficou taxado o preço das dedicações desinteressadas. E, sobre o qualificativo de “Sebastianistas” que a gente dos generaes empresta tão facilmente àqueles que não lhes são subservientes é ainda mais expressivo elegante e escriptor que se occulta sob aquelle pseudônymo. Sabe o Correio Amparense quem são os sebastianistas?

São os seus alliados levianos, que com aquella facilidade e descaramento em que no mesmo dia da revolução beijaram a face do Marechal Deodoro hão de abraçar a d. Sebastião no mesmo dia da restauração.

E sabe quem são os criminosos?

São os que endeusam a um dictador.

Sem requisitos para os cargos supremos e no outro dia por questão de pessoas, passam a detrahir a um funccionário legal, embora esse funcionário seja o Deus da véspera.

Esses é que são os sebastiamistas e criminosos contra quaes o povo deve atirar a maldição sobre a maldição.

Quantas verdades e quantas carapuças tão bem talhadas e que tão bem se adaptão a certas cabeças de politicões que dormiram à sestas monarquistas e acordaram republicanos.

PITOMBA

SEÇÃO LIVRE – 3
DECLARAÇÃO NECESSÁRIA
Pedi nesta data ao governo do Estado minha exoneração do cargo de Promotor Público desta Comarca.

Em um logar onde a jogatina sem freio, serve de garantia para o bom êxito de uma política que tenha como autoridade qualquer carneiro de batalhão... A isso não me presto.

Que se arrumem!

Amparo, 16 de setembro de 1898.

a) José Rodrigues dos Santos

CAPITALISTAS II
1891
Em 1891, nova relação, podendo-se notar o considerável aumento do capital do Sr. João Rodrigues da Silva em relação a 1888.

· Deixo de relacionar o imposto.

· João Rodrigues da Silva - 200:000$000

1891 - Relação dos capitalistas amparenses e do impôsto devido pelos mesmos:

NOME
CAPITAL
IMPÔSTO

João Rodrigues da Silva
200:000$000
200$000

Manuel Ortís de Siqueira Freire
150:000$000
100$000

Barão de Campinas
100:000$000
100$000

Antônio Pereira Marques
49:000$000
49$000

Luís de Sousa Leite
40:000$000
40$000

Marcos da Silveira Gomes
20:000$000
20$000

Joaquim Rodrigues Galante Júnior
16:000$000
16$000

Joaquim Antônio de Almeida Sobrinho
15:000$000
15$000

Albino Alves do Amaral
10:000$000
10$000

Antônio Manso de Almeida
10:000$000
10$000

Manuel da Silveira Silvestre
5:000$000
5$000

Antônio da Costa Bispo
5:000$000
5$000

Elias Lourenço Gomes
5:000$000
5$000

Francisco Gonçalves Cerdeira
5:000$000
5$000

Libório Marques Ribeiro
2:000$000
2$000


CAPITALISTA – 1888
Para que o leitor tenha um parâmetro dos valores que serão relacionados, informa a venda, publicada na imprensa, de um sítio de 35 alqueires com 5.000 pés de café pelo preço de 6:500$000 (6,5 contos de réis).

Outro parâmetro foi a primeira sorte grande vendida em Amparo. Bilhete n. 4628 da Loteria da Corte, vendida por Serafim Cabrito, em 1885 o prêmio foi de 30:000$000 (30 contos de réis), considerado uma verdadeira fortuna.

Interessante é que a Lei n. 92, de 12 de abril de 1887, obrigava os capitalistas a divulgarem o seu capital e o imposto devido.

RELAÇÃO DE 1888
NOME
CAPITAL
IMPÔSTO

Tte. João Rodrigues da Silva
130:000$000
130$000

Com. Joaquim Pinto de Araújo Cintra
100:000$000
100$000

Major José Jacinto de Araújo Cintra
50:000$000
50$000

Antônio Pereira Marques
40:000$000
40$000

Com. Zeferino da Costa Guimarães
30:000$000
30$000

João da Silva Leme
30:000$000
30$000

Joaquim Manoel de Campos Pinto
20:000$000
20$000

Capitão Albino Alves do Amaral
10:000$000
10$000

Manuel Silvestre da Silva
8:000$000
8$000

Viúva de Carmo Picorelli
5:000$000
5$000


Como se pode constatar, o imposto representava 1% (um por cento) do capital.

ESTRADAS I
Ó Presidente da Província de S. Paulo, em 1868, determina o engenheiro N. Bennaton para fazer estudos objetivando a abertura de uma estrada de Campinas a Amparo.

Determina que a estrada comporte trânsito de carros, salientando que os caminhos existentes para Campinas e Bragança são praticamente intransitáveis.

O engenheiro Bennaton completa o seu trabalho, estimando as despesas com as obras em 40 contos.

A estrada mediria menos de 7 léguas (uma légua= 6,6 Km)

Estuda, paralelamente, a medida para a estrada de Serra Negra.

Em 1871, foram construídas as estradas para Três Pontes e Duas Pontes.

Em 1885, informou-se que Amparo fez um empréstimo de 262 contos para tornar possível o prolongamento da estrada Rio Claro a Jaú.

ESTRADAS II
Em 1889, finalzinho do século XIX uma comissão formada na Câmara composta pelo Dr. Francisco Antonio de Araújo, João Belarmino Ferreira de Camargo e João Aleixo de Godoy informa a existência no Município das seguintes estradas.

A que partindo de Campinas passa pelos bairros de Entre Montes e Varginha;

A que partindo de Pedreira passa por Coqueiros (hoje Arcadas);

A que vem de Campinas passando pelo bairro da Areia Branca;

A que saindo de Amparo, segue para Itatiba passando pelos bairros dos Rosas e Onças;

A que liga Amparo a Bragança passando pelos bairros do Córrego Vermelho e Pântano;

Amparo a Bragança passando pelo bairro dos Limas;

Para Socorro, passando pelos bairros dos Alves, Moenda, Falcão e Mostardas;

Para Monte Alegre seguindo até Serra Negra;

Estrada para Moji Mirim passando pelo bairro do Pantaleão;

Para Itapira passando pelo bairro dos Leais.

CRUZ PRETA
Os acontecimentos do passado são importantes, servem de modelos para evitar erros do presente e concorrem para aperfeiçoar o futuro. Isso vale para a história de uma cidade, de um Estado, de um País e do Mundo. Vale, também, para a vida das pessoas. Os acertos do passado devem ser copiados e se possível aperfeiçoados.

Vou citar um exemplo que envolve a minha vida e a vida de meu município, Amparo. Periodicamente, costumo visitar o nosso Museu, principalmente para ler os antigos jornais. Considero muito interessante conhecer o comportamento da sociedade antiga, sem os progressos atuais e fazer as minhas comparações. Em minhas leituras descobri que no final do Século XIX foi criada uma sociedade comunitária, formalmente organizada com diretoria e tudo mais. A sociedade estava intimamente ligada ao serviço funerário.

Naquela época os enterramentos eram feitos nas igrejas ou no Cemitério da Fábrica, hoje Jardim Público de Amparo. Nas igrejas eram enterradas pessoas abastadas, da elite. Assim sendo, a Igreja Matriz, hoje Catedral, e a do Rosário, serviram de cemitério. Porém, os indigentes eram conduzidos até o cemitério, em caixões, cedidos pela funerária. Os corpos eram depositados nas covas mas os caixões voltavam para a funerária.

A sociedade comunitária a que me referi recebeu o nome de “SOCIEDADA HUMANITÁRIA CRUZ PRETA”. Sua finalidade era auxiliar as famílias pobres por ocasião do falecimento de um de seus membros. Forneciam, gratuitamente, os caixões evitando constrangimentos às famílias mais carentes, em razão da falta de recursos financeiros. Os membros da Sociedade organizavam listas de contribuições para a compra e estocagem dos caixões. Praticamente todos os dias a “Cruz Preta” publicava nos jornais, que naquela época eram diários, só não circulando às segundas feiras, os atendimentos, divulgando os nomes dos falecidos.

Suas atividades se estenderam por muitos anos, saindo do Século XIX, para o Século XX. Porém, em 12 de fevereiro de 1903, foi convocada uma Assembléia Geral da Sociedade, com vistas à liquidação da mesma. Seus membros estavam indignados com críticas que parte da sociedade lhes dirigia versando sobre prestação de contas e atendimentos a famílias não suficientemente carentes.

Houve os defensores, transcrevo alguns trechos de artigo, a respeito dessa decisão, publicado no Jornal “O Comércio do Amparo”, em fevereiro de 1903:

“... A idéia, portanto, de sua liquidação enche de pezar a todo amparense e leva ao coração do pobre, que via na Cruz Preta a sua última esperança de que haveria uma caridade gloriosa, que salvaria o seu cadáver dos horrores do abandono e o acompanharia à última morada.

... E como a existência da ‘Cruz Preta’ interessa a todo o público amparense, é uma necessidade social imprescindível, tomamos o partido de appelar para a generosidade e o desinteresse dos dignos associados, no sentido de da continuação da benemérita sociedade. Lembrem-se dignos sócios que toda obra que tem que contar com a gratidão humana, sentimento fellaz e incerto, há de forçosamente encontrar no seu caminho maior número de espinhos, do que de rosas.

Justamente ahí reside o grande triumpho, a grande glória da caridade desinteressada. Christo foi crucificado por ter pregado o bem e a razão não é suficiente para abandonarem a estrada aspérrima das boas ações?

Se tem havido censura ao procedimento da ‘Cruz Preta’, fiquem certos os dignos associados e a esforçada diretoria que a voz geral de applausos e de louvor aos seus actos é mais do que suficiente para abafar, um ou outro grito, descabido de protesto.”

Pois bem, a “Cruz Preta” parou seus atendimentos por um mês e meio, voltando a atender a 14 de março de 1903, para alegria da sociedade. Salvo engano ela cessou suas atividades mais ou menos dez anos após essa data.

-E, o que isso tem a ver com a minha vida?

-Explico!

No final de 1993, eu era vereador. A Câmara recebeu Projeto de Lei, criando a taxa de sinistro com a finalidade de financiar o Corpo de Bombeiros. Eu, vereador experiente, apresentei uma emenda criando o funeral gratuito, mas não para indigentes, e sim para todas as camadas da sociedade. Achei muito interessante que o pobrezinho recebesse o mesmo tratamento de alguém da Classe Média. Meu argumento foi de que a morte era um sinistro e, portanto, a emenda caberia perfeitamente no Projeto.

Aproveitei-me da ocasião e aperfeiçoei a idéia da benemérita “Sociedade Humanitária Cruz Preta”. O Projeto foi aprovado, transformou-se em Lei, mas foi anulado por inconstitucionalidade. Porém, caiu a taxa de sinistro, mas a emenda não. Devo dividir os méritos com o Prefeito João Cintra, que atendeu o meu pedido não vetando a emenda. E, em comum acordo a propositura foi regulamentada. A urna era de excelente qualidade. Não havia e não há, até hoje, demérito algum para a classe média utiliza-la. Algumas urnas, mais sofisticadas são pagas, mas seus preços são sensivelmente mais baratos do que os praticados em qualquer outro município.

O benefício já dura 14 anos, com alguns milhares de atendimentos. Acabaram-se as promissórias e as “vaquinhas” feitas para cobrir as inevitáveis despesas.

Sem falsa modéstia, como vereador, consegui muitos benefícios para a sociedade amparense, porém, esse foi o mais importante e que me orgulha mais. Enquanto permaneci na Câmara lutei para que as urnas e os serviços não perdessem a qualidade e quando isso ocorreu consegui com muita luta restaurá-lo

Finalizando o povo amparense deve exclamar: OBRIGADO “CRUZ PRETA”.

Enterros e Cemitérios
Os cemitérios foram problemáticos no século XIX. A mortalidade era grande, havendo através dos tempos discussões a respeito.

Nos primeiros temos os enterramentos eram feitos em Bragança, distante 7 léguas (1 légua = 6,6 Km) por péssimos caminhos.

Vejamos, a seguir, algumas informações que julgamos interessantes.

Em 1841, faleceu e foi enterrado DENTRO da Matriz, Floriano Xavier dos Passos um dos mais antigos moradores do Amparo.

Em 1848 é mencionado o enterramento, dentro da Igreja do Rosário, de Gertrudes Maria de Jesus, com 50 anos. Faleceu de hidropisia.

Em 1852 o Vigário José Honório da Silva reivindicava junto ao Presidente da Província (hoje seria o Governador do Estado) a construção de um cemitério alegando que os cadáveres eram sepultados no adro e dentro da Matriz. Afirmada que nas chuvas a enxurrada poluia o rio Camandocaia.

Em 1859, a Câmara oficiou ao vigário solicitando-lhe que não prosseguisse no costume de enterrar corpos humanos no pátio da Igreja Matriz pedindo-lhe que utilizasse o Cemitério do Rosário até que se ultimasse o Cemitério Municipal em construção.

Em 1860 já existiam os cemitérios de Rosário e o da Fábrica.

O cemitério da Fábrica localizava-se no Jardim Público onde hoje temos uma escola infantil. Era o Cemitério Público.

Mesmo assim alguns enterramentos ainda eram feitos nas igrejas.

Cemitério dos Protestantes
A Religião Católica era a religião oficial do Estado. Assim sendo os protestantes encontravam dificuldades para seus enterramentos que eram proibidos nos cemitérios existentes.

Em 1869, um imigrante suiço de religião Luterana pede à Câmara autorização para fazer um cemitério para sua família e outros de sua seita.

No ano seguinte a Câmara examinava e aprovava o lugar escolhido para cemitério dos protestantes.

No dia 30 de Maio de 1870 o Governo determinou que nos cemitérios que dessa data em diante forem construidos no Município se reserve sempre espaço para aqueles que não professem a religião do Estado.

Imigrantes
Em 1890 realizou-se um movimento no sentido da nacionalização de imigrantes.

O jornal “Correio Amparense” publicou em sua edição do dia 11 de maio de 1890 uma relação de estrangeiros que optaram por manter a nacionalidade de origem.

Entre os nomes encontramos muitos ascendentes de pessoas que fazem parte, hoje, de nossa sociedade.

Interessante notar que em muitos dos relacionados figurava primeiramente o sobrenome antes do nome propriamente dito.

imigrantes
Relação dos estrangeiros que, na secretaria da intendencia municipal desta cidade, fizeram declaração de querer conservar sua nacionalidade. De 19 a 20 de abril de 1890:



NOME
NACIONALIDADE
PROFISSÃO

Cucato Giusseppe
Italiano
Lávrador

Roveral Annibal



Lucio Giacome



Ghiroldelli Agostini



Pavan Giulio



Graniti Danieli



Longato Antonio



Baraldi Francisco



Ghiraldelli Ariatide



Brocaletti Giovanni



Peter Jacoba
Allemão


Ferrari Leonardo
Italiano


Stocco Gionanni



Golinelli Felippe



Bevini Angelo



Fini Lazaro



Tomassini Alexandre



Salvator di Napoli



Marcolongo Virrerio



Marcolongo Angelo



Costa Angel



Marcolongo Agostino



Stopazzolo Giacinto



Dorigan Giovanni



Gabrieli Luigi



Borini Antonio



Gabrieli Giuseppe



Mineghetti Antonio



Palazzi Giovanni



Bagio Luigi



Sgantin Giacomo



Baldrin Domenico



Zangerolano Luigi



Pizzollito Giuseppe



Guerinno Bosi



Giuseppa Perini



Miola Eurica



Affonso Tudoschini



Toniol Giuseppe

Oleiro

Mari Cesare

Lávrador

Gelaro Angelo



Mari Giuseppe



Mari Anselmo



Vesco Antonio



Borasca Salvino



Ougurato Sinte



Foriato Giovanni



Parelli Giuseppe



Maria Andrés



Lago Benjamino



Passarello Francisco



Vian Annibal



Antonio Pascoale



Zanin Angel



Renzo Zunocente



Maria Montagueri



Cafagni Celeste



Perou Benedicto



Maufin Luigi



Lazarin Santo



Renzi Victorio



Cervi Angelo



Chiosi Artaban



Ravagnan Aniceto



Foroni Giuseppe

Pedreiro

Balarini Luigi

Lávrador

Acorai Gaetano



Miola Sante



Carizio Rosa



Palazzi Giuseppe



Luiz Rogato



Victoria Scabola



Boldrin Agostini



Rossi Giuseppe



Fini Mamgnte



Botolletti Giovanni



Maurotto Tsidoro



Artusi Antonio



Rebecca Antonio



Marchesin Battista



Posini Ferdinando



Carnassini Luigi



Baratti Antonio



Antonio Tomellari



Giovanni Bosi



Manoel Patfe
Australiano


Evangelista Bosi
Italiano


Barbieri Liverio



Mario Saraphine



Mario Antonio




Retratista
Chegou ante-hontem a esta cidade o sr. Alfredo Evangelista da Costa, distinto retratista, a quem estava confiado a excução do retrato do sr. Dr. Francisco Antonio de Araujo, digno presidente da camara que acaba de findar o seu mandato, o retrato que lhe vae ser offereccido por algumns empregados do commercio desta cidade.

Tivemos occasião de ver o retrato e é nossa opinião que elle faz honra tanto ao artista que o executou como a briosa corporação que d’ella lhe fez encomenda para de tal forma dar ao digno presidente da câmara uma demonstração do seu profundo reconhecimento para com s. s..

NOTICIÁRIO
Inauguração da praça do mercado. – Como já dissemos inaugurou-se no dia 1º às 4 horas da tarde a nova praça do mercado.

Apesar do mau tempo a concurrencia foi numerosa sendo difficil penetrar-se no alpendre da praça onde o povo se agglomerara.

Às 4 horas da tarde sahiu do paço municipal a camara encorporada, precedida do pavilhão brasileiro e de uma banda de musica, seguindo-se-lhe grande numero de cidadãos.

Chegada a edilidade em frente ao edificio, foi saudada por muitas baterias e rojões, tocando a banda de musica que acompanhava a bandeira brasileira e a outra banda que alli se achava já o hymno nacional.

Procedendo-se depois a benção da praça cuja ceremonia foi celebrada pelo revdº padre Agnello, o illustrado presidente da camara sr. dr. Francisco Antonio de Araujo, pronunciou um eloquente discurso em que o honrado cidadão enumerou os variados melhoramentos realisados pela camara que acabava o seu mandato e fazendo votos pela prosperidade do municipio, contando para isso com os esforços e boa vontade da camara que vae encerrar seus trabalhos, terminou por saudar á cidade do Amparo e aos amparenses, saudações que foram enthusiasticamente correspondidas pela maça de povo que escutava com o respeito que merece.

Após o discurso do illustrado sr. dr. Araujo o sr. Fortunato goulart pronunciou em breves palavras um agradecimento que o commercio enviava á illustrada edilidade que tão brilhantemente honrara o seu mandato entregando a cada um dos vereadores e ao revdº sacerdote um bonito bonquel do qual pendiam laços de fitas, brinde que o sr. dr. Araujo agradeceu em breves phrases.

Seguiu-se depois um abundante copo de cerveja servido no ultimo quarto do mercado, cujo serviço esteve a cargo do sr. Marcolino Antonio Martins, e para o qual houve convite geral, sendo incançavel ainda o sr. dr. Araujo em convidar a todos sem distincção, para o acompanharem n’aquella festa popular.

Durante a tarde tocaram alternadamente as duas bandas de musica, a do sr. Antonio Palmieri e a do sr. Benedicto Marques, as quaes generosamente se prestaram a abrilhantar o acto com as harmonias das bandas de que são distinctos os directores.

Ao escurecer voltou a camara para o paço municipal aonde depositou o pavilhão nacional, acompanhada ainda pelas duas bandas de musica e grande maça de coro.

Uma vez alli ainda o illustrado sr. dr. Araujo dirigiu ao publico, que enchia o edificio da camara, um eloquente agradecimento a todos quantos o acompanharam n’aquella, saudando de novo o Amparo e todos os amantes do progresso desta terra.

E assim terminou a festa, ficando entregue ao publico o novo mercado, cessando por consequência o velho pardiero que até este momento servira de praça.

Honra a illustre edilidade que assim fechou o seu mandato, com os applausos geraes.

De seus honrados sucessores muito temos a esperar dos esforços e da abnegação que os caracterisa em todos os seus actos.

Parabens ao Amparo.